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Mulher, mãe, psicopedagoga... tantas e uma só! Única, como todas nós. A educação é paixão e auxiliar famílias nessa jornada sempre foi um prazer.

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Marília Magra

Marília tinha problemas com o seu peso, dieta nenhuma adiantava, estava sempre gordinha.
Acreditava que era bem por isso que já estava dobrando a casa dos trinta, ainda encalhada. Como queria emagrecer pra se casar!
Um dia resolveu seguir o exemplo de suas amigas: se matriculou numa academia de ginástica. Escolheu uma bem pertinho do trabalho pra não ter desculpa.

Segunda-feira de manhã bem cedinho já estava lá. Quase dormia em cima de cada aparelho, o cansaço tomava conta de todo seu corpo.
Trabalhar naquele dia foi um martírio! parecia que todos os seus músculos estavam em revolta, tudo cheio de nós, protestando contra a violência... devia ser como tomar uma surra daquelas de "arriar doido" como um pedaço de pau...

Na terça tentou fazer na hora do almoço. Quem sabe depois da metade do dia passado, ela conseguiria estar mais desperta e as atividades rendessem mais, não é? Não foi!
A esteira era um inferno: dava-lhe dores nas canelas...
A ergométrica era uma tortura: dava-lhe dores nas costas...
Sofrimento!

Quarta-feira, resolveu ir depois do expediente, até que o resultado foi bom: ficava mais fácil ir direto pra casa, tomar um banho quente e se arrastar até a cama.
Deitou em todas as posições que podia imaginar, mas nada adiantava. Rolou na cama gemendo até não aguentar mais e dormiu, exausta, só depois das três da manhã.

Levantou na quinta-feira, atrasada, depois de esgotar mentalmente todas as possibilidades de desculpas para não ir ao trabalho. Que vontade de inventar uma doença que justificasse sua ausência na repartição! A responsabilidade falou mais alto.
No ônibus lotado, ela sentia vontade de gritar cada vez que alguém encostava em qualquer parte do seu corpo, gente distraída! Por que tem que esbarrar sempre onde está doendo? Acabou perdoando porque de nada adiantava mudar o lugar das trombadas, doía tudo, mesmo...
Deu seis da tarde e ela foi para o calvário, quase chorando! Conversou com o instrutor que não conseguiria sobreviver a mais um dia daquela coisa. Ele lhe disse para tomar um relaxante muscular.
Foi o desespero que a fez resolver passar na farmácia depois da malhação, quando só o que queria era deitar na calçada, ali mesmo, na frente da casa de tortura.
Dormiu melhor com a tal drágea, apesar de ter pesadelos horríveis com a ditadura militar e paus de arara durante a noite toda.

Sexta-feira, mais um suplício!
Era o último dia da semana... o instrutor tentava lhe dar ânimo, dizendo que a dor era passageira, que logo ela se acostumaria... ela pensou que ele devia estar certo: o ser humano se acostuma com tudo...
Resolveu se acostumar com seus pneus e nunca mais pisar lá!
Foi nisso que entrou um cara liiindo... um deus grego!

Marília ficou alucinada e nem sentia mais a canela enquanto tentava esticar o ouvido pra descobrir quem era o pão... mas nem conseguiu ouvir nada, nem foi notada. Foi pra casa, se sentindo uma adolescente, deitou e dormiu sonhando com o bonitão.

Na semana seguinte, foi dia após dia pra academia pra ver o pretendido pretendente. Todos os dias ele estava lá, como podia ser tão... tão? Ele era... ela babava... e malhava.

Seis meses depois, nessa rotina frenética, ela quase dez quilos e meio mais magra: conseguiu arrancar o primeiro olhar do cara.
Na semana seguinte foi um aceno. Ai!!!
Na outra ele chegou perto! Era uma quinta-feira...
Ela se sentia como se fosse entrar em erupção a cada passo que ele dava em sua direção... ele chegou bem perto, disse "meu nome é Clóvis" e o mundo desabou!
Clóvis tinha um mau hálito de doer e a moça nem conseguia prestar atenção ao que ele dizia, fez de tudo pra encerrar a conversa o quanto antes. Senhor! Ele não parava de falar!

Coitadinha... ela teve que trocar de academia, porque o cara grudou e não largava mais do seu pé.
Linda, magra e só... antes assim que mal acompanhada!

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Uma Casa no Campo

Juntou paus e pedras, areia e tijolos pra construir um refúgio do mundo. Era a tal "casa no campo" cantada por Elis, que se fez sonho na cabeça de toda uma geração. Pôde dividir o espaço com a família e os amigos, guardar e saborear os discos e os livros.

Viu os filhos crescerem entre as árvores, criarem asas e voarem como a infinidade de pássaros que habitam o lugar.

Sonhou um refúgio, mas colocou de pé um lugar onde o encontro e o reencontro consigo mesmo o fez mergulhar no interior, onde estava sempre cercado daquilo que era mais importante: seu mundo inteiro.

A casa sempre cheia de gente, também tinha muitas idéias. Um tanto do que escreveu e compôs talvez seja devido ao mezanino que trazia as estrelas, o sol e a chuva pro cenário. Fora da janela a poesia estava feita, como fruta no pé, pronta pra ser colhida.

Hoje a casa é distante, como os motivos que a fizeram ser. Finalmente o sonhado aconteceu e ela cumpre o seu papel de reunião em torno do fogão à lenha para as escapadas da realidade.

Já não vive a vida lá... nem ele, nem ninguém. Já não quer e não pode fugir diariamente - que ironia, bem hoje que era o momento, naqueles seus planos que mais parecem é ter vontade própria!

Também me sinto cria sua, brincando de remexer o passado e descobrir as memórias. Hoje eu, moleque perdido no tempo entre as fotografias da arte e da luta, fui conhecer uma casa... mas o que vi foi uma ponte de aproximar as almas.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Terapia

Roberval e Geni se casaram há uns quinze anos atrás, tudo como mandava o figurino: igreja, padre, juiz de paz, recepção, bolo, espumante, véu, grinalda, chuva de arroz e noiva virgem!

Na rotina de horas-extra do marido, que aumentava a cada dia, Geni percebeu que seu casamento poderia ter um outro elemento - não menos tradicional - a OUTRA. E foi escarafunchando os bolsos da calça dele que lhe veio a confirmação: o famigerado bilhetinho apaixonado de Marcelina.

Não era o dia do Roberval. Tinha que ser no mesmo dia em que ele que passou um apuro danado, quando saiu da casa de Marcelina às pressas, desviando das coisas que ela atirava nele e com o ultimato para que só voltasse lá depois de se livrar da esposa?

Parecia que o mundo ía ruir. A amante que resolveu pôr tudo a perder (aquela insensível!) e a esposa aos berros, fazendo o relato de toda a história do casal: desde o primeiro beijo, o altar depois de três anos e cinco dias de namoro e dois anos e quatro meses de noivado, os três anos e duas semanas de casamento...

Geni jurava que a história com a tal rapariga já era antiga, mas ele a convenceu (sabe Deus como) de que era recente. Ela chorou, mas acabou dormindo como um anjo.

No dia seguinte, acordou disposta a salvar o casamento dessa crise. Foi aí que sua prima de segundo grau lhe indicou a Doutora Cecília, especialista em terapia de casais, para mediar a reconciliação.

Roberval não sabia se era mais difícil encarar as tais consultas onde a esposa ficava tentando descobrir "onde tinha errado", ou as horas que passava com Marcelina. Bem que ele tentava "explicar" para a namorada que "logo" deixaria a esposa, que só não o tinha feito ainda porque ela era muito nervosa e estava em tratamento psicológico, tão grave que ele tinha até que acompanhá-la na terapeuta (ele nunca abriria o real motivo dos encontros semanais no consultório).

Parece que a Doutora era profissional de verdade!

Marcelina, pobrezinha, ainda chora as saudades de Roberval... mas Geni parece nem lembrar que já foi casada quando vai pra gafieira nos sábados à tarde.

O Roberval? Ah! Roberval está curado... é de-casa-pro-trabalho e do-trabalho-pra-casa!
A Doutora, digo, Dona Cecília nunca teve uma só queixa do marido... e olha que já vai fazer onze anos de casamento mês que vem.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

A ordem das coisas

Meu nome é Zenide. É isso aí: Z-E-N-I-D-E!!! Sempre tive um probleminha com isso, sarrinhos a vida toda... também ouvi muitas piadinhas com o fato de ser desorganizada...

A minha professora da primeira série superou a todos e juntou os dois: ela me disse uma vez que eu sou assim, meio sem rumo, porque até o meu batismo foi fora de ordem (trocadilho besta do meu nome com Denize, embaralhado). Isso traumatiza, sabia?

Há algum tempo atrás eu ouvi, sei lá onde, que deixar as coisas em ordem ajudam a organizar o estado emocional... missão quase impossível, pra mim!

Eu acho que é bem verdade o fato de que se vive melhor num espaço arrumadinho, limpinho, cheiroso e tal, mas daí a pensar que isso pode (e deve) ser algo que reflete diretamente na organização das idéias era pra acabar!

Bom, o pior é que pouco tempo depois eu ouvi falar que o contrário fazia sentido... as pessoas equilibradas emocionalmente eram aquelas que conseguiam manter tudo em volta em perfeita harmonia: começou a minha crise!

Caracas, eu nunca consegui manter nada arrumado! Pra minha casa ficar um pouco ajeitadinha, eu tinha que organizar tudo e sair! Bem rápido!

Dez minutinhos no sofá da sala já me são suficientes pra um sapato virado, um copo vazio no chão, um livro aberto logo ali, o telefone, o cinzeiro, os cigarros, tudo fora do lugar!

Juro que tentei mudar... de dentro pra fora e de fora pra dentro... Nada!

Acho que fiquei neurótica! Tudo ajeitado antes de mais nada e tchau! E eu? Eu fiquei por último.

Dei um basta! Tomei as rédeas da situação: Contratei uma empregada.

Já tenho 38 anos e não preciso de receita de "não ser eu", ou de "ser eu melhor", ou de "ser melhor", o que seja!

Vi que pôr "ordem na coisas" é mais que colocar tudo certinho, pôr "ordem nas coisas é eleger prioridades... eu em primeiro lugar!

Que se dane a bagunça, primeiro eu: linda, equilibrada, feliz... e eu!

Não mais nem aí pro que "ouço dizer", ninguém deve estar, mesmo... nem você... ah! esqueça o que eu disse!

O que importa?

Alex... É o menino mais badalado da turma.

Um gatinho!

Quer e consegue convencer a todos de quanto é seguro de si. Tem todos onde quer...

Semana passada ficou com aquela garota que é o sonho de todo mundo, e ela está no último ano!
Linda, pernas bem desenhadas, bundinha dura e seios em pé... um tesão!

Mas ele fez como sempre: deu uns beijos na menina, disse "te ligo amanhã" e ainda não ligou... ela está esperando lá, talvez até deitada (porque sentada por tanto tempo dói demais).

Mais uma pra listinha... e a fama de bonzão só aumenta.
Ele anda com os caras mais legais do lugar, sempre se veste super bem e usa um perfume delicioso.

Seus amigos todos têm uma pontinha de inveja, de como ele é tão popular e sua opinião acaba sendo sempre a verdade, mas deixar de andar com ele é um problema... não sobrariam mais as gatinhas que ele deixa pra trás, alguém tem que consolar as coitadinhas e quem melhor do que o amigão do malvado?

Nas brigas, ele sempre leva vantagem... não briga com muita frequência, mas o cara é grande e também não leva desaforo pra casa: Soca o olho de qualquer um que ultrapassar o limite, sem pensar, nem perder a classe.

Ele adora fazer piada de tudo e tem um jeito especial de fazer a galera toda rir... às vezes ele passa dos limites tirando sarro dos que ele chama de "esquisitos". Ele é cruel, mesmo... sem dó...

A bola da vez é o coitado do Fabiano, um menino franzino que senta lá no fundo da sala. O Fá não tem muitos amigos, na verdade ele só tem duas amigas, nenhum dos caras se arrisca a ser visto com ele. Ele não tem nada... não tem força, é baixo, não tem grana, nem é engraçado... é até meio CDF. Que chato!

Alex não... pode tudo... até tirar onda com a cara do Fá - o bundão que chora em público sem nenhuma cerimônia.

O Fabiano não tem ninguém...

O Alex tem todo mundo... todo mundo, menos o Fá... o segredo que lhe rouba o fôlego.

Só falta o Fá... e a coragem!

Tarde da Noite

Era tarde da noite... ela estava lá, deitada em seu quarto, como quase sempre.

Bem que ela queria sair dali e assistir televisão, ler um livro no sofá da sala, ou atacar à geladeira... mas não! Só o fato de cruzar com alguém da família no corredor já fazia sumir qualquer pretenção menos emergente do que fazer xixi.

Ela ficava ali, deitada, sem coragem pra nada além de ouvir aquele CD. Denovo aquele CD que sempre a deixava deprimida. Era uma coisa assim como ter saudades, sem saber de quem ou do que... era evitar o mundo querendo estar em outro lugar.

No meio dessa ânsia dava um aperto no peito, um nó na garganta de vontade de gritar tudo... tudo o quê? Nem ela sabia, mas dava vontade de colocar pra fora.

Pensou em se vestir e sair, sem dar satisfações a ninguém, pra lugar nenhum, sem hora pra voltar.

Quem sabe conhecer alguém? Dar um bom beijo na boca de um estranho pode ser a melhor
solução... ou uma forma de criar um problema real pra administrar.

Será que era esse o problema? A falta de problemas reais pra se envolver?

Enquanto refletia sobre sua vida, a origem do universo, a repressão feminina e o dilema da relação custo-benefício entre a pílula e o DIU, ela dormiu... Sonhou com vampiros. Acordou com o despertador e se arrumou pra aula, sem pensar em mais nada.

O início... ou sobre como escrever pra ninguém.

É... escrever pra ninguém, sim!

A maioria dos blogs são um espaço desconhecido, não visitado, não comentado.

Creio que muitas das pessoas fazem do blog um lugar pro desabafo, quase como o antigo diário, mas melhor do que o caderninho velho!

E este é bem desse jeitinho!

A diferença é que as pessoas escreviam o diário e se preocupavam com o fato de alguém encontrá-lo, de ter seus segredos revelados, sua privacidade invadida... hoje estamos em um novo tempo, uma época em que as pessoas não têm mais tanto medo de dizer o que sentem e pensam! E ainda temos a possibilidade do anonimato da Internet que permite se "esconder" atrás de um Nick, se assim for mais confortável.

Diferente do diário, não há nada de secreto no que as pessoas dizem (escrevem) num blog, que de tão público até perde a graça de ser lido... acho some muito do desejo de saber do outro, descobrir seus anseios e seus medos, quando o outro grita tanto de si. Deixa de ser proibido e, bem por isso, de ser tão gostoso...

Nem vou discutir a necessidade de aparecer que vivemos nos dias de hoje, isso é coisa profunda demais pra agora, dá "pano pra manga" demais pra esse primeiro post, que só tem a pretensão de ser um ensaio pro que há por vir de daqui de dentro... e tem coisa abeça pra colocar boca à fora.

Pra mim, o blog é isso: meu espaço pra gritar o que quase ninguém está nem aí pra ouvir...
Nem sei se há alguém lendo o que escrevo, mas escrevo pra você... pra você ler, pensar, responder.

Essa é minha caverna escura, onde me escondo publicamente de todos os que nunca vão ler e dos que fazem que não lêem, por preguiça ou falta de vontade de comentar. É a minha caverna...

Será que há eco aqui?